Briga de par.


Queria correr. Deixar o vento bater em meus cabelos e me guiar a frente. Já tinha perdido o gingado e sentada na rua de paralelepípedos, sob luz baixa eu me acalentava com palavras bonitas, mas pouco esperançosas. Aquele era o terceiro lugar no qual tinha ido para fugir de mim mesma, mas esta sempre me acompanhava. Me lembrando da embriaguez, batendo-me a cara pedindo reação e eu estava inerte. 
A falta de pertencimento tomava conta das ruas e todas pareciam longas retas que me empurravam em sua plenitude de solidez para fora das mesmas. Eu estava inconstante demais para permanecer ali. Cambaleante pus-me a andar, troncha, exausta. Quando a briga é consigo mesmo tudo se torna dobradamente mais cansativo. 'Não há vagas', era o que estava escrito, em vermelho, em neon, em placas de madeiras carcomidas pelo tempo. Não havia em ninguém espaço para mim. Logo me vi mais uma vez sozinha. Dubiamente esquecida e tão logo começou a me faltar o eu. 
A cada esquina um tapa, eu já não mais aguentava, com ela eu gritava e esta queria se impor, se fazer presente. Mas que merda, você só me aborrece! Ache morada em outra área vizinha. 
Mas é sempre muito difícil se mandar embora de sua própria vida. 
Nesse breve momento me questionei como para todos isso parecia tão mais fácil. Ninguém transparecia marcas de luta ou exaustão de mais uma corrida entre você e própria sombra. Então, porque diabos eu haveria de padecer por dias dores horrendas de açoites que eu mesma me fiz? 
Fique quieta, não faça isso, não sinta isso, não fale isso, não o assuste. 
Ser "autônomo" de si nunca me pareceu mais solitário. 

Parei na praia. 
Olhei para a imensidão, agora negra com a hora avançada da noite.
Me cheguei.
Toquei a areia com os pés que suavemente esfoliavam o cansaço e as dores da longa caminhada. Enchi os pulmões de maresia e por dentro me senti balançar, Minha água balançava com a do mar. Já não era mais eu ali. Cantei para Iaiá, para agradar, para dizer que lá estava. Com permissão concedida senti o sal cortar os lábios, o líquido invadir os cabelos e os dedos sumirem da superfície. Ali, submersa tudo era mais sereno. Não havia luz, não havia som. Não havia a mim. Somente uma vastidão em que nada se via, mas que contrária a minha, não era possível me sentir perdida. 
O ar começou a faltar, então subi e quando arfei em vida nada mais estava. Nada mais pertencia. Eu havia expandido para a vastidão e a vastidão expandiu-se a mim, como um. No entanto, não havia mais alguém que tivesse vindo em preocupação me pegar no mar quando nele mergulhei. Não houveram palavras de preocupação, não houve um abraço que confortasse. Desta vez juntamos forças, eu e aquela na qual brigava e nadamos. A cada braçada um choro, uma vontade de deixar o corpo ali, que ele pertencesse ao infinito sereno, que nada despertava, que nada doía, mas não podia. Tinha, por obrigação extinta, que voltar.
Com o corpo molhado e frio senti-me na orla e como uma entidade que vagava, ninguém me percebia. Minha presença só poderia ser sentida a quem fosse sensível o bastante para entender que ali, no nada, ainda havia alguma energia. 
Larguei-me ao destino e lá deitei. Pensei que se a maré enchesse e me levasse, era porque deveria ser assim. Caso não, eu levantaria e correria, como quis no princípio de tudo, mas desta vez com uma noite de vantagem para saber para onde e como fazer. E se lá de novo eu me perdesse talvez me entregasse, mesmo que não seja virtuoso quem se vê triste e por conta disso logo desiste.  

2 comentários:

 

Instagram

Translation Bar